terça-feira, 31 de dezembro de 2013

D. JOAQUIM GONÇALVES


FALECEU O SENHOR DOM JOAQUIM GONÇALVES

BISPO EMÉRITO DA DIOCESE DE VILA REAL


Faleceu hoje, pelas 16.00h, na Póvoa de Varzim, onde residia com o irmão padre e uma irmã, enfermeira aposentada, vítima de ataque cardíaco.

Naturalidade

Nasceu aos 17.05.1936 na freguesia de Revelhe (lugar de Cortegaça, concelho de Fafe, Arquidiocese e Distrito de Braga, filho de António Gonçalves e de Albertina Rodrigues Ferreira e Melo, sendo o terceiro de oito filhos.
Na aldeia fez a escola primária.

Estudos

Desde 1948 a 1960 frequentou e concluiu os cursos de Humanidades, Filosofia e Teologia nos Seminários Arquidiocesanos de Braga, sendo ordenado Presbítero aos 10.07.1960, na capela do Seminário Conciliar de Braga.
Nesse mesmo ano foi nomeado Coadjutor da paróquia de S. José de Ribamar – Póvoa de Varzim, e professor de Educação Moral e Religiosa Católica no então Liceu Eça de Queiroz até 1976, sendo também Assistente local do CNE (Escutismo Católico Português) e das ENS (Equipas de Nossa Senhora) e do CPM (Centro de Preparação para o Matrimónio), deste em plano nacional.
Em 1974 licenciou-se em Filosofia pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto, disciplina que leccionou nas Escolas Secundárias de Barcelos, Eça de Queiroz na Póvoa de Varzim e Sá de Mirande em Braga, de que foi professor efectivo.

Vida episcopal

Em 18 de Outubro de 1981, na cripta da Basílica do Sameiro (Braga, foi ordenado Bispo Auxiliar de Braga, com o título de Ursona (Osuna, cidade vizinha de Sevilha), sendo o primeiro bispo natural do concelho de Fafe.
Trabalhou na Arquidiocese até 1987 e em Maio desse ano foi nomeado Bispo Coadjutor de Vila Real, de que tomou posse canónica  aos 24.061987, e onde entrou solenemente aos 28 do mês de Junho desse ano.
A 18.01.1991 tornou-se o 4.º Bispo da Diocese.
Na Conferência Episcopal Portuguesa foi membro da “Comissão Episcopal das Migrações e Turismo”,da “Comissão Episcopal de Liturgia e Presidente da Comissão Episcopal das Missões”e fez parte do Conselho Superior da Universidade Católica Portuguesa
Em 13.10.1987, ainda Bispo Coadjutor, dava início à publicação da IGREJA DIOCESANA - Folha de Informação e Comunhão Pastoral da Diocese de Vila Real, em folhas fotocopiadas. O último número  data de Dezembro de 1993. Reapareceria mais tarde com o mesmo título, como Jornal trimestral e ainda continua..
Organizador e organizado, em Abril de 1989 publicava os Estatutos do Arciprestado, acompanhou muito de perto a revisão dos Estatutos do Conselho Presbiteral, publicados na segunda versão e a primeira depois da publicação do novo Código de Direito Canónico, em 1989, aprovados pelo senhor D. António Cardoso Cunha. Promoveu festa de homenagem e despedida ao senhor D. António Cardoso Cunha, em 16 de Fevereiro de 1991, que, devido às disposições conciliares, pediu a resignação aos 75 anos e lhe seria concedida a 19 de Janeiro 1991.
O Centro Católico de Cultura seria criado em Novembro de 1991; em Junho de 1991 foram os Estatutos do Conselho Económico Paroquial.
Citemos ainda os Planos de Pastoral, com sugestões para as próprias actividades a realizar, ao longo de vários anos.
Para o Clero instituiu as recolecções mensais, o Dia de Retiro no princípio da Quaresma e animou a construção da Casa para o Clero idoso ou doente.

Trabalhos publicados

Durante os anos de vida académica colaborou nos jornais rgionais: Povo de Fafe e Diário do Minho, e já sacerdote, no Seminário Ala Arriba da Póvoa do Varzim, e na revista de pastoral Celebração Litúrgica (Braga).
Publicou no «Boletim do CPM» um trabalho de pastoral social sobre “A Dimensão Social do Matrimónio” e um outro sobre “O Apostolado do Doente” no II Congresso de Problemas de Apostolado, em Braga.
Do seu magistério episcopal há algumas homilias publicadas no Boletim oficial da Arquidiocese de Braga – “Acção Católica” e tem colaboração variada, ao longo dos vários anos de Bispo em Vila Real, no semanário “A Voz de Trás-os-Montes” e, muitas vezes, no pequenino Boletim “Ave Maria”.
Publicou, por ocasião dos 75 anos da Diocese, a Pastoral «Um Povo em Festa», na Páscoa de 1993, a reflexão pastoral sobre as Festas Religiosas – texto de reflexão e normativo e um livrinho, muito simples, acessível a todos, sobre o Baptismo.
Possui inéditos alguns textos poéticos, um deles – A Noiva do Marão – musicado para uma cantata por J. Santos e executada em Roma,  A Travessia – poema Transmontano – por ocasião do”XXV aniversário da minha Ordenação”, em 18 de Outubro de 2006, em oratória, publicada em livro e em CD, executada em Roma (onde foi gravada) e em todos os concelhos da Diocese. .
Lembremos ainda os opúsculos sobre os Vitrais da Catedral, sobre a Igreja do Carmo, em Vila Real e o Outro Jonas onde revive a experiência da passagem à vida, quando do transplante.

Não é possível referenciar tudo… tão vasta e variada é a sua obra.

Homem experimentado no sofrimento

Quando veio para Vila Real, acompanhava-o uma preocupação: a sinusite que o perseguia desde há anos. E, de facto, numa das primeiras noites sentiu-se mal. Chamado o médico do Seminário, o já falecido Dr. Campos (Filho) disse-lhe: “Senhor Bispo, não se trata de sinusite, ou eu me engano muito ou é do coração. Consulte quanto antes um bom cardiologista. Olhe que as coisas não estão bem”. E no dia seguinte foi ao Porto e já não voltou para Vila Real sem a operação às coronárias. A 12 de Janeiro de 2008, é novamente operado, desta vez para receber o transplante, o 1.º em Portugal numa pessoa com idade tão avançada. Foi o sucesso que lhe permitiu viver até hoje.

A Igreja e a Diocese perdem um grande bispo, de palavra fácil, bom comunicador, com grande capacidade de adaptação ao auditório, acessível à gente mais simples, com um sentido muito grande de pastoral.

Senhor Dom Joaquim, a Diocese de Vila Real está-lhe muito grata e pede ao Senhor da Messe e Cabeça da Igreja que lhe abra as portas do seu Reino. 



Vila Real, 31 de Dezembro de 2013

sábado, 14 de dezembro de 2013

MENSAGEM DE NATAL DO SENHOR BISPO DE VILA REAL


Apóstolos captados e marcados pela alegria de Jesus Cristo

Diz o Papa, na recente Exortação Apostólica Pós-Sinodal que a “Alegria do Evangelho”, que enche a vida da comunidade dos discípulos, é uma alegria missionária (n.21). De facto, a Boa Nova de Cristo, gratifica, é digna de crédito, fecunda e base da esperança, que se alicerça na Palavra de Deus que interpela, nos leva para fora de nós, a acolher e a anunciar o dom recebido do amor, que sempre comunicável, convidativo, que leva ao êxodo, à saída, ao dom de si, enriquecendo quem o dá e quem o recebe.
1. - A Igreja de Deus, enviada, por Cristo, em missão e animada, pelo Espírito, escuta, recebe, vive, anuncia e espelha a alegria messiânica da libertação, vinda de Deus, para mover os corações e ser transmitida, por irradiação e contágio. Esta alegria salvífica faz parte do núcleo do mistério do Natal e foi anunciada à Virgem Maria e aos pastores. Os discípulos de Jesus comunicam-na, após a Páscoa, para que todos a transmitam e a recebam, crendo e beneficiando da eficácia da morte e ressurreição do Senhor, que se revela, no júbilo e união da Igreja, que vive da fé no Ressuscitado, na esperança do Seu retorno. Certos de Jesus estar vivo e dar a vida e a glória do Pai, como as testemunhas oculares, repletos de alegria anunciamos o júbilo e a esperança da Vinda do Senhor. Os discípulos que sucedem aos Apóstolos e ás testemunhas oculares transmitem a alegria do testemunho recebido, dando de graça o que de graça receberam, fiéis e obedientes ao mandato missionário do Ressuscitado que enviou amigos, seguidores e discípulos, pelo mundo inteiro, a testemunhar a maravilha do Seu amor e a grande alegria da Sua Vinda e Ressurreição: “Ide, fazei discípulos de todos os povos, baptizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a cumprir tudo o que vos tenho mandado” (Mt 28, 19-20).
A Igreja de Cristo vive, sempre, em êxodo, de saída para as periferias, ao encontro dos homens necessitados, famintos da verdade e amor, que só Cristo lhes assegura. Ele é o amor e a verdade, por excelência, que está no seio do Pai, donde provém, para, por Ele e n’Ele, obtermos a vida divina, que é dada aos que crêem no Filho de Deus. A Sua vinda, morte e gloriosa ressurreição são a razão de ser da perene alegria e salvação. Esta grande alegria, que muda e converte os corações, é evangelizadora, transmite o evangelho da libertação, a grata e boa notícia vinda até nós, a modificar e aperfeiçoar tudo e a dar esperança e sentido à vida humana e terrena.
2.- A Palavra de Deus, que ilumina e interpela o homem, convida-o, sempre, a sair de si e da casa, a deixar-se a si mesmo, a descentrar-se, a despojar-se e a ir ao encontro do outro e da terra, que Deus promete, mostra e assegura, como dom da Sua bondade. Assim sucedeu, com Abraão, Moisés e os Profetas, convidados a deixar a terra, a ir e a sair, rumo à terra que Deus lhes prometeu e para a missão, que lhes confiou. Como diz o Papa: “somos chamados a aceitar o convite a sair da comodidade e à coragem de alcançar todas as periferias que precisam da luz do Evangelho” (n. 20).  
Deus tem, sempre, a iniciativa, está e deve estar, sempre, em primeiro lugar, devendo o discípulo de Cristo ser devorado pelo desejo de tornar Deus conhecido e amado, dando a conhecer o Seu divino Filho e nosso Salvador, Mestre e Senhor. A alegria, que foi anunciada, pelos Anjos aos pastores de Belém e vivida pelos Discípulos, que viram Jesus Ressuscitado, nasce e expande-se, graças ao encontro, na doce intimidade e união, com o Ressuscitado. A alegria provém do encontro com Deus, do Seu amor que nos toca, que de nós se apodera e que nos amou primeiro.
3.- A Igreja de Deus, enviada pelo Ressuscitado a fazer discípulos, a baptizar, ensinar e dar testemunho do mistério do amor de Deus, manifestado, em Seu Filho, que desceu dos céus, para procurar e salvar os doentes, perdidos e pecadores, não se deve fechar em si mesma, acabrunhada, a anunciar a morte e o desespero, sempre triste, depois do Seu Mestre, Senhor e Esposo, livremente, se ter entregado, por nós, em redenção, fazendo o bem e assegurando ao mundo a esperança e a alegria.
As Paróquias e Famílias devem ser escola, púlpito, espaço de comunhão e participação e criar proximidade e solidariedade das pessoas, formando os agentes da missionação e transmitindo aos outros a vivência e o anúncio de Cristo. É Cristo, que, pelo Seu Espírito, nos galvaniza, move e suscita, em nós, a alegria messiânica, que provém da Fé na Encarnação, Vida, Morte e Ressurreição do Filho de Deus glorificado que está connosco, vive e actua na Igreja, irradiando a alegria e a caridade de Deus, no mundo.
4.- Já, em pleno Advento, à espera do Natal, na Solenidade da Imaculada Conceição da Virgem Santíssima, padroeira da Diocese, que é o pré-anúncio e a aurora da Vinda e da Encarnação do Filho de Deus, exorto a anunciar, testemunhar e a fazer discípulos de Cristo. Peço, para colocar os bens salvíficos, que Deus nos dá, em prol dos que vivem nas periferias da ignorância, do abandono, da solidão, do desespero e da pobreza material, moral e espiritual, cientes de que a Luz de Deus brilha, nas trevas, para ser recebida e tornar filhos e herdeiros, não nascidos da carne, do sangue ou da vontade humana, mas de Deus (Jo 1,13), a fim de que a Sua de Cristo, que, em nós, se espelha, brilhe diante dos homens e todos se congreguem na glória e alegria de Deus Pai.
Desejo aos caros Diocesanos a alegria, a paz e as bênçãos, que os Anjos comunicaram aos pastores de Belém, para que o Evangelho de Jesus converta as consciências e os corações, participando da glória e dos frutos da Sua vinda, dando aos outros o nosso testemunho de amor fraterno, na alegria redentora da missão cristã.

+ Amândio José Tomás, bispo de Vila Real

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

AS TRÊS VINDAS DE CRISTO


         No tempo que nos conduz ao Natal, temos sempre como pano de fundo as duas vindas de Cristo de que nos fala o Novo Testamento: a sua vinda no tempo histórico determinado por Deus e a sua segunda vinda (a Parusia), da qual não sabemos o dia nem a hora. Sobre esta segunda vinda, reza um dos prefácios eucarísticos do Advento:
Vós nos escondestes o dia e a hora,
em que Jesus Cristo, vosso Filho,
Senhor e juiz da história,
aparecerá sobre as nuvens do céu
            revestido de poder e majestade.
Nesse dia tremendo e glorioso,
Passará o mundo presente
E aparecerão os novos céus e a nova terra.
Entre estas duas vindas, situa-se aquela que acontece na vida da Igreja, em cada um dos seus membros, iluminando e fortalecendo o seu dia a dia. Essa não tem lugar nem tempo marcado, nem é esperada para o fim dos tempos, mas dá-se sempre que nós, tocados pelo sopro do Espírito, deixamos que Cristo entre e tome conta da nossa vida. Ele avisa-nos da sua chegada e pede que o recebamos: “Olha que Eu estou à porta e bato: se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, Eu entrarei na sua casa e cearei com ele e ele comigo” (Ap 3, 20). Falando desta vinda presente, o mesmo prefácio continua:
Agora Ele vem ao nosso encontro,
em cada homem e em cada tempo,
para que O recebamos na fé e na caridade
e demos testemunho da gloriosa esperança do seu reino.
Se olharmos de novo para o texto de Ap 3, 20, ao qual poderíamos juntar outros, como por exemplo Lc 24, 13-35 (o encontro do Ressuscitado com os discípulos de Emaús), damo-nos conta de que aquele que venceu a morte, também agora, no momento presente, nos quer fazer participantes do banquete do seu Reino, o qual tem a sua expressão terrena na Eucaristia. É nela que Jesus Cristo ressuscitado se torna presente, irrompendo com toda a sua força para nos ajudar a cristificar a vida. Nela afirmamos convictamente “Ele está no meio de nós”, mas tal asserção de fé só se torna real se levarmos a sério a Eucaristia.
Em tal contexto litúrgico e vital, o sacerdote cristão aparece como aquele que torna actual esta presença eucarística de Cristo. Sem sacerdócio não existiria Eucaristia, mas também sem Eucaristia o sacerdócio não teria razão de ser, nem sequer existiria a Igreja (cf. João Paulo II, A Igreja vive da Eucaristia, caps. II e III). Neste mistério radica a grandeza do sacerdócio e ao mesmo tempo a sua condição de serviço humilde à Igreja, que torna possível a presença luminosa e operante de Cristo em cada baptizado. Daqui deriva também a gratidão profunda que todos os fiéis cristãos, que participam do sacerdócio baptismal, devem ter para com Cristo, que lhes doou o sacerdócio ministerial.
A gratidão de que acabámos de falar não nos pode levar  a pensar no sacerdócio cristão como constitutivo duma casta que tudo sabe e detém todo o poder, à maneira do sacerdócio judaico do tempo de Jesus. A este propósito, são oportunísimas as palavras de Bento XVI, na sua carta aos sacerdotes: «Neste contexto, há que recordar o caloroso e encorajador convite feito pelo Concílio Vaticano II aos presbíteros para que "reconheçam e promovam sinceramente a dignidade e participação própria dos leigos na missão da Igreja. Estejam dispostos a ouvir os leigos, tendo fraternalmente em conta os seus desejos, reconhecendo a experiência e competência deles nos diversos campos da actividade humana, para que, juntamente com eles, saibam reconhecer os sinais dos tempos"».
Reconhecer os sinais dos tempos: eis um grande desafio lançado a toda a Igreja e, por ela, ao mundo de hoje.

NOTA: A este propósito, recomendamos a leitura do Sermão de São Bernardo que hoje nos é proposto na Liturgia das Horas (ofício de leitura da quarta-feira da primeira semana do Advento).